Sólido Volátil
Curadoria de Eder Chiodetto
Setembro de 2024




formas
que formam o infinito
que nos desformam
chegam para relembrar
que a vida é feita
para brincar
nosso díptico nos uniu
viramos uma obra só
só sabemos viver em um
meu ritmo desacelera
com seu reflexo
medito
a voz das ondas
o Sudoeste
nosso parque de diversões
o movimento
nosso êxtase
entramos nessa esfera
vazia
nesse lugar desconhecido
que parece familiar
um regresso
um sentimento
ambíguo
esse oco existencial
será que olhando o passado
passamos a entender o presente?
eu te perguntando
você me perguntando
todos nos perguntando
se no silêncio
escutamos um ao outro
se no silêncio
nos preenchemos
se nos desconstruímos
para nos reconstruirmos
se desaprendemos
para juntos, aprendermos
a viver
a memória
nossa ilha de edição
embaralhando
o tudo e o nada
a certeza
da inexistência do tempo
a incerteza
da nossa existência
me espanto
com a distância
como um sopro
vou projetando
meu desaparecimento
me alienando
no meu próprio corpo
alguma coisa me abraça
me diz que eu sou eu
me diz quem sou eu
um sabor
uma nota
me esconder com você
nós dois
navegando ao mesmo nó
raiando na lua
procuro a caminhada sem fim
Luciana Rique
Sólido Volátil
Certas artistas, ao se depararem com os dilemas da existência, que inevitavelmente contém narrativas opressivas e signatárias de traumas adquiridos ao longo da vida, fazem do gesto artístico uma forma terapêutica de superação desse estado das coisas. A arte irrompe, então, com seu potencial de transmutação da realidade, capaz de criar um ambiente acolhedor e terapêutico.
Em Sólido Volátil, a artista segue partindo de imagens fotográficas, as quais ela obtém por meio de uma forma singular de captar vestígios, encontros de formas, cadências de luz e texturas que, em geral, escapam a um olhar menos atento. Essas imagens, que emergem de um estado contemplativo e se manifestam como a materialidade visível de um universo particular, agora se esmeram em tornar volátil a solidez dos pesos e contrapesos que insistimos em carregar vida afora.
Luciana Rique expande o uso da fotografia, buscando agora um diálogo das imagens com materiais que criam tensões e distensões no corpo das obras, resultando em peças nas quais a leveza, o equilíbrio e um premente estado de fruição sensorial dão a tônica que impulsiona esse desejo de transmutação.
Os suportes tradicionais da fotografia como o papel, a moldura e o vidro perdem seu caráter utilitário que visa apenas a conservação das obras. Assim, a fotografia passa a ser objeto, o vidro se torna obra, o reflexo e a opacidade revelam como as luzes incidentais moldam nossa percepção do mundo.
Território de apaziguamentos e equilíbrios de forças contrárias, a obra visual e poética de Luciana Rique se configura como um ambiente que tem a capacidade de restaurar o eixo abalado pelos desequilíbrios dos nossos dias. Ou como diz o poeta mexicano Octavio Paz: “...a luta se resolve no poema, com o triunfo da imagem que abraça os contrários sem aniquilá-los”.
Eder Chiodetto